Foto retirada do Blog: http://maringaparanabrasil.blogspot.com.br/ |
Naqueles
longínquos anos, havia na Vila Operária, próxima à Igreja São José e ao Cine
Horizonte, uma casa de tolerância pouco tolerada pelas mulheres do bairro. Chamavam-na Casa de Irene. A Liga das
Senhoras Cristãs chegou a fazer uma manifestação pública, que começou na praça
da igreja e seguiu em caminhada até o difamado lugar, mas sem resultado para
elas. A casa era grande, de alvenaria pesada, pintada de branco, com telhas de
barro vermelho pretejadas pelo tempo. O muro baixo, o simpático jardim com
canteiros de rosas e margaridas e dois gatos sem raça definida sempre deitados
na varada durante o dia diziam ser uma residência comum, habitada por alguma
respeitada família maringaense. Mas era a partir das sete horas da noite que o
movimento começava e seguia até a madrugada. Aos sábados e domingos, alguns
homens iam à missa e depois à Casa de Irene.
A
casa era frequentada por muitas pessoas comuns e evitada pelos figurões da
cidade, pois não havia nenhuma privacidade na entrada e qualquer um via quem
entrava e saía. Mas um vereador, que
chamarei aqui pelo improvável nome Josevaldo,
era assíduo na casa. Era um homem respeitado, esposo de esposa
respeitada. Ela, da Pastoral da Família, comprava roupas caras nas lojas da XV
de Novembro em época em que não havia shoppings na cidade. Ele, vereador em
segundo mandato, treinava tênis de campo num clube todas as manhãs de
quinta-feira. Eles, os cabelos pintados, sorridentes, frequentavam as colunas
sociais. A um colunista Josevaldo pagava para ver estampadas num jornal
fotografias suas em festas de aniversário, batizados, jantares
beneficentes.
Josevaldo
chegava a pé à Casa de Irene, vestindo roupas com as quais não era visto nas
sessões da câmara e nem no seu escritório de advocacia, usando uma peruca
ridícula e óculos escuros. Sentava-se num canto do bar improvisado e aguardava
alguma das meninas de Irene se aproximar e pedir que lhe pagasse uma
bebida. Com a primeira já se retirava para
o quarto, demorava pouco mais de meia hora e ia embora sem falar com mais
ninguém.
Um dia chegou à Casa de Irene uma menina de Ivatuba a quem chamavam de Monique pela semelhança com a Evans, que era capa de muitas revistas na época. Pois aconteceu: Josevaldo se apaixonou por ela. Não era a mais bonita, nem a mais gostosa, mas tinha uma voz rouca que sussurrava, uns olhos perdidos no nada, e Josevaldo não quis mais outra, perdeu-se naqueles olhos perdidos e na voz sussurrante. E se antes ele ia à casa de Irene a cada quinzena, passou a frequentá-la duas, três vezes por semana. Chegou a faltar à sessão da câmara. E depois de dois meses, quis exclusividade, não conseguia imaginar a menina nos braços de outro homem. Seu plano era tirá-la da casa, alugar para ela um quarto e sala em um prédio barato da cidade.
Mas antes que isso acontecesse, sua esposa descobriu o malfeito. Apesar dos honorários advocatícios, do salário de vereador e da gratificação de 30 por cento dos vencimentos de dois assessores da câmara, trocou o filé-mignon pela alcatra ou mesmo pelo patinho, começou a perguntar à mulher se não desperdiçava nas lojas o dinheiro que ganhava com tanto suor. Ela não era trouxa e juntou os pedaços: os compromissos noturnos quase que diários, a sovinice e a ausência na cama. Pagou um moleque para seguir o marido, logo descobriu onde o sem-vergonha deixava a diferença entre o filé-mignon e o patinho. E soube de Monique. Contratou o mesmo moleque: queria que retalhasse o seu rosto, que ela ficasse desfigurada. Ele a seguiu numa manhã de domingo até a igreja, onde a vigiou durante a missa, acompanhou o seu fervor nas orações. Seguiu-a no retorno à Casa de Irene e, no meio do caminho, apontou-lhe uma faca e a levou para uma casa abandonada na Marcílio Dias. Com a mesma arma, fez três cortes profundos em seu rosto.
Hospital, delegacia, investigação. Josevaldo acompanhou tudo à distância. Um dia, no carro, a esposa ao lado, ouviu a notícia: Monique prestara depoimento à polícia, contara que um rapaz a ferira e que não sabia o motivo. Josevaldo olhou a esposa, que desviou o olhar. Então soube.
A polícia arquivou o inquérito, ficaram as cicatrizes no rosto de Monique. Então ela não pôde permanecer na Casa de Irene. Foi trabalhar na rua, atendendo moleques com pouco dinheiro e até mendigos nos terrenos baldios, atrás dos muros. Um dia, pouco mais de meio ano depois, Josevaldo a viu na Joubert de Carvalho. Era pouco antes das 19 horas, e ela já se oferecia aos transeuntes. Vestido curto, os cabelos maltratados, um sorriso simulado e as cicatrizes. Josevaldo desviou os olhos antes que ela os descobrisse. Aumentou o volume do rádio, sorriu para a esposa, que estava ao lado, e seguiu para a igreja. Era dia de missa.
Mas antes que isso acontecesse, sua esposa descobriu o malfeito. Apesar dos honorários advocatícios, do salário de vereador e da gratificação de 30 por cento dos vencimentos de dois assessores da câmara, trocou o filé-mignon pela alcatra ou mesmo pelo patinho, começou a perguntar à mulher se não desperdiçava nas lojas o dinheiro que ganhava com tanto suor. Ela não era trouxa e juntou os pedaços: os compromissos noturnos quase que diários, a sovinice e a ausência na cama. Pagou um moleque para seguir o marido, logo descobriu onde o sem-vergonha deixava a diferença entre o filé-mignon e o patinho. E soube de Monique. Contratou o mesmo moleque: queria que retalhasse o seu rosto, que ela ficasse desfigurada. Ele a seguiu numa manhã de domingo até a igreja, onde a vigiou durante a missa, acompanhou o seu fervor nas orações. Seguiu-a no retorno à Casa de Irene e, no meio do caminho, apontou-lhe uma faca e a levou para uma casa abandonada na Marcílio Dias. Com a mesma arma, fez três cortes profundos em seu rosto.
Hospital, delegacia, investigação. Josevaldo acompanhou tudo à distância. Um dia, no carro, a esposa ao lado, ouviu a notícia: Monique prestara depoimento à polícia, contara que um rapaz a ferira e que não sabia o motivo. Josevaldo olhou a esposa, que desviou o olhar. Então soube.
A polícia arquivou o inquérito, ficaram as cicatrizes no rosto de Monique. Então ela não pôde permanecer na Casa de Irene. Foi trabalhar na rua, atendendo moleques com pouco dinheiro e até mendigos nos terrenos baldios, atrás dos muros. Um dia, pouco mais de meio ano depois, Josevaldo a viu na Joubert de Carvalho. Era pouco antes das 19 horas, e ela já se oferecia aos transeuntes. Vestido curto, os cabelos maltratados, um sorriso simulado e as cicatrizes. Josevaldo desviou os olhos antes que ela os descobrisse. Aumentou o volume do rádio, sorriu para a esposa, que estava ao lado, e seguiu para a igreja. Era dia de missa.